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EDUCAR - QUAL O SEU MÉTODO?

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T alvez os pais estejam vivendo um momento em que as dúvidas sobre como educar seus filhos sejam maiores do que foi em qualquer tempo. São vários os motivos que intensificam as dificuldades para educar, mas neste artigo vamos privilegiar as dificuldades decorrentes do uso inadequado de palavras que foram descoladas do seu significado, comprometendo dessa forma o entendimento adequado da realidade e, dessa maneira, ocasionando práticas educacionais cujos resultados desastrosos revelam o perigo que elas representam.

 

 

Vamos analisar o significado e o entendimento, por exemplo, da palavra autoridade que muitas vezes é usada e entendida como se fosse algo negativo, prejudicial à saúde das relações; como se autoridade estivesse relacionada à tirania, ao cerceamento da liberdade. Segundo o dicionário Michaelis, a palavra autoridade é definida como o direito ou poder de mandar, de ordenar, de decidir, de se fazer obedecer. É fundamental que se entenda que pai e mãe são autoridades na vida dos filhos. Eles têm não só o direito, mas também o dever de se fazer obedecer pelos filhos, pois cabe aos pais, de acordo com a Constituição, o dever de assistir, criar e educar os filhos menores. Ou seja, falar em educação é falar do exercício da autoridade dos pais e, por consequência, é saber que os filhos devem obediência aos pais. O exercício adequado da autoridade é capaz de desenvolver na criança o sentimento de confiança, porque a condução firme faz com que ela se sinta segura, protegida, amparada, cuidada, e esses sentimentos são imprescindíveis para o seu pleno desenvolvimento.
 
 
Wellington Armanelli apresenta neste poema infantil O castigo alguns aspectos importantes relacionados aos métodos utilizados na educação das crianças. Vamos observar atentamente, estrofe a estrofe, o que ele nos diz, porque, à primeira vista, se você utilizar como referência teorias da educação questionáveis, pode-se pensar que há problemas na colocação do autor.

 

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Comecemos pelo título - O castigo. Vamos entender o que o autor quer dizer com castigo, pois, quando falamos em castigo, muitas vozes se levantam, visto que, para aqueles que defendem o “pedagogicamente correto”, essa palavra é considerada inadequada no processo educativo.  _ Mas não se deve castigar quando o mau comportamento é reincidente?, os mais sensatos poderão perguntar. Pois é, talvez as pessoas, donas das vozes que se levantaram, tenham em mente a lembrança de se colocar a criança ajoelhada no milho. Claro que não é desse tipo de castigo que o poema aborda, pois já faz tempo que temos conhecimento da ineficácia dessa forma de punição.
 
Vamos novamente recorrer ao dicionário para buscar o significado de castigo:
1. pena ou punição que se inflige a pessoa ou animal;
2. observação sobre um erro ou uma falta; repreensão, admoestação; (...)

 

Ficaremos com esses dois significados que nos interessam no contexto da educação, pois é dessa forma que a palavra castigo é abordada no poema.
 
1ª estrofe - Tem mãe que não sabe / Com o filho se haver / Não fala, só xinga / Só pensa em bater.
O autor abre o poema com um erro crasso que ocorre no processo educacional - é o erro grosseiro de considerar o xingamento e o bater como formas de educar. Na verdade, quando agimos dessa forma, estamos na contramão da boa formação, que deve buscar o desenvolvimento integral da criança. O uso frequente da coerção moral e física (o xingamento e o bater) certamente contribuirão para a deformação do caráter da criança, e não para a formação de um ser saudável, capaz de bem conviver.
 
O escritor e educador expõe claramente a situação dessa mãe: ela não sabe como educar seu filho; ela não fala com ele, não há diálogo; os únicos meios que ela utiliza para “corrigir” a criança são xingar e bater.  Podemos observar isso no uso da palavra “só”, que exclui outras formas de abordagem. O xingamento implica em rotular a criança com características negativas, implica em não combater o erro, e sim em ferir psicologicamente a criança. Importa saber que o processo é considerado educativo quando a autoridade consegue ensinar à criança que o que ela fez está errado, pois é fundamental que a criança entenda que o erro está na ação que ela praticou, ou na forma como essa ação foi praticada, e que isso pode e deve ser corrigido. Deve ser ensinado que as ações erradas têm consequências que prejudicarão, não somente a própria criança, como também, a outras pessoas. Ensinar que o erro precisa ser corrigido é ensinar à criança a ser responsável pelas suas ações, além de dar a ela a possibilidade de diferenciar o certo do errado.
 
Aristóteles diz que o objetivo da educação é fazer com que a criança goste e desgoste do que é certo gostar e desgostar. E quando a idade do pensamento reflexivo chegar, a criança educada nas “afeições ordenadas” ou nos “justos sentimentos” terá mais facilidade para encontrar os princípios primeiros na Ética. Encontramos essa citação no livro “A abolição do homem” de C. S. Lewis. E tendo como base esse ensinamento aristotélico, podemos concluir que não se deve gostar de xingar, tampouco gostar de ser xingado. Assim como não deve haver prazer ou agrado em bater ou em ser espancado.  Ao educar, esses erros devem ser corrigidos e não adotados como práticas de correção pelos pais.
 
2ª estrofe - Mas tem muito filho / Que é bobo demais / Se a mãe não castiga / Do erro não sai.
Nessa estrofe fica claro que há um entendimento incorreto da criança, e a origem desse erro pode estar na maneira equivocada de correção usada pela mãe (ou pelo pai), como vimos nos primeiros versos. Essa criança não aprendeu ainda a escutar e executar ordens, isto é, ela não aprendeu que deve obediência à autoridade que seus pais representam na sua vida. E, claro, para ela aprender, isso precisa ser ensinado. A obediência é uma virtude que nos dispõe a acatar uma ordem, a considerar as regras que foram estabelecidas, a executar uma instrução dada, ou cumprir o que foi pedido. A obediência na infância é imprescindível para que a criança tenha a sua segurança e o seu desenvolvimento moral, intelectual, emocional e psíquico assegurados.
 
Mas a palavra obediência também tem sido muito desgastada, e por isso temos tido tantos problemas na educação dos nossos filhos, e esses problemas repercutem na forma como as pessoas se relacionam umas com as outras. Porque, no exercício da autoridade, em qualquer instituição, a obediência às regras e aos valores estabelecidos é necessária. Isso significa dizer que o filho que obedece aos seus pais, está reconhecendo a autoridade que a eles cabe, e será capaz de fazer isso em todos os seus relacionamentos, o que é fundamental para a manutenção da ordem, que possibilita o progresso das relações humanas com os seus desdobramentos.
 
3ª estrofe - O certo é o caminho / Que corre no meio / Conversa de amigos / Sem raiva ou receio.
O diálogo deve ser a base das relações humanas. Dialogar significa ir em busca de algo além de si mesmo, significa você se colocar de forma disponível para escutar o que o seu semelhante tem a dizer, e de falar o que verdadeiramente você sente e pensa. Quando o outro nos escuta e nos compreende, há um sentimento bom de que é possível interagir com êxito. Poucas sensações são tão significativas na nossa convivência como aquelas que têm a sua origem na comunicação clara, honesta e verdadeira. E por que isso acontece? Sem dúvida, porque a maior consequência do diálogo é a compreensão. E, sendo assim, não há motivos para termos receio de dialogar, de escutar e falar honestamente.
 
O diálogo é muito importante na educação dos filhos. Ele permite que os pais identifiquem os pontos fortes da criança, e também aqueles que precisam ser melhorados; permite aos pais perceber se a criança expressa o seu pensamento e as suas emoções de forma clara, e, assim, eles poderão ajudá-la a perceber o que é real, ensinando-a a diferenciar o que é fato daquilo que é apenas uma impressão, algo que passou no pensamento da criança motivado pela emoção. Enfim, é uma rica oportunidade de fluxo de conhecimento, dos pais para os filhos e dos filhos para os pais, e grandes descobertas são feitas em meio a esse fluir de palavras que podem promover ensinamento, conhecimento e entendimento.
 
4ª estrofe - O pai e a mãe juntos / Para o filho guiar / E o filho querendo / Os pais agradar.
Na educação da criança, pai e mãe, no exercício das suas funções, devem guiar os filhos. O que isso significa? Significa dar limites, ensinar a respeitar, significa fazer com que a criança perceba que a obediência à lei e à ordem é fundamental para a convivência saudável e para o seu bom desenvolvimento, não só moral e psíquico, mas também intelectual; significa também ensinar a apreciar o que é verdadeiro, o que é belo e bom, e a identificar o que é falso, feio e mal.
 
Viver é estar em constante relação, e a criança precisa entender que existem as suas demandas, mas também existem as demandas do outro, e que as regras são estabelecidas para possibilitar uma convivência saudável. Ela só terá condições de desenvolver o sentimento de empatia, se ela tiver esse senso de limite, em que o respeito e a obediência devem estar presentes, e estes, por sua vez, poderão promover a consideração pelo seu semelhante, e, assim, permitir o desenvolvimento do espírito cooperativo, que se amplia na solidariedade.
 
E na tarefa de guiar, sem sombra de dúvidas, o exemplo é a maneira mais eficaz de educar os nossos filhos. As crianças inspiram-se no exemplo dos pais e das pessoas mais velhas do que elas; elas copiam gestos, atitudes e ações. Sendo assim, o que é praticado pelos pais tem maior força, contém maior poder de assimilação do que aquilo que é apenas falado. Se os pais falam uma coisa e fazem outra, essa contradição apresenta um grande obstáculo para o aprendizado do que é certo. 
 
5ª e 6ª estrofes - Ditado acertado / Eu sei que é aquele / A mãe que ama o filho / Severa é com ele. / Severa com amor / Bem firme com a mão / Mas sempre educando / Com o coração.
Temos nesses versos mais uma palavra - severa - que causa grande alvoroço nos defensores da pedagogia romântica, aquela centrada nos interesses da criança e, por isso, dá a ela uma força que se desdobra em um perigoso protagonismo que não lhe cabe, pois a criança é um ser em formação, portanto, precisa ser orientada e não tem condições de assumir o papel principal no processo educativo.
 
Interessante como na educação romântica as palavras cujos significados apresentam força, rigor, densidade, são usadas em sentido pejorativo e totalmente descoladas do seu significado. As pessoas que compartilham dessas ideias românticas se esquecem de que a natureza humana precisa ser educada, elas se esquecem também de que os valores não são fenômenos naturais, porque não nascem com a criança, eles devem ser inculcados e desenvolvidos. Como as velhas aves ensinam as novas a voar, os pais devem iniciar os seus filhos nos mistérios, nas belezas e dificuldades da humanidade, em que certo e errado devem ser diferenciados, em que o direito deve estar atrelado ao dever, em que o prazer, a alegria e a felicidade são conquistas, portanto, resultantes do esforço, e devem estar em consonância com a moral tradicional e o bem comum.
 
Quando isso não acontece, temos uma perigosa inversão de papéis: os pais se submetendo às ordens dos autoritários filhos. É isso mesmo – se os pais não assumem a autoridade que lhes compete, os filhos assumirão uma atitude autoritária perante eles, e tentarão fazer isso com as outras pessoas da sua convivência.
Novamente pedimos ajuda ao dicionário. Vamos trazer alguns dos significados do Houaiss para a palavra severo.
 
1. Pouco ou nada inclinado à indulgência; que impõe as condições com todo o rigor; rígido, rigoroso ‹julgamento s.› ‹um juiz s.›
2. inflexível nas decisões ou na disciplina ‹sempre se mostrou s. com a família›
3. aplicado com rigor ‹punição s.›
 (...)
5. que requer circunspecção; importante, grave ‹foi uma decisão s.› 
(...)
7. que não dá margem à repreensão ou censura; austero, digno ‹sempre revelou um comportamento s.›
8. que se cumpre com rigor; implacável, inflexível ‹abstinência s.›
9. que mantém cuidadosamente um padrão de comportamento ou autodisciplina; pontual, exato, impecável, sério ‹era um s. cumpridor de suas obrigações›
10. digno de respeito; nobre, elevado ‹suas ideias eram grandiosas e s.› 
(...)
 
Todos os significados acima, em alguma medida, podem ser aplicados no processo educacional. Há momentos em que se faz necessário ser severo com a criança, e não se deve ter tolerância em relação ao não cumprimento do dever, tampouco à reincidência de erros graves.
 
Há situações em que a flexibilidade não é cabível, pois poderá colocar em risco a integridade física e mental da criança. Existem momentos em que não há espaço para negociações, eles dispensam, por parte dos pais, maiores explicações para o seu sim ou para o seu não: - “Você vai fazer assim (ou não vai fazer), porque eu estou dizendo, e eu sou sua mãe (ou seu pai), sou a autoridade na sua vida e sei o que é melhor para você.” - e pronto.
 
Muitos pais têm medo de exercer essa severa autoridade quando necessária, porque talvez pensem que perderão o amor do filho se agirem dessa forma; no entanto, essas situações exigem deles justamente essa postura severa. E há mais a saber: o amor é um sentimento muito sofisticado, e para aprender a amar, a criança precisa, antes de tudo, aprender a respeitar, visto que não é possível amar quem nós não respeitamos. Então, cabe sim ao pai e à mãe serem severos quando a situação assim o exigir.
 
7ª estrofe - “Mamãe e meu paizinho, / Façamos um trato: / Vocês me orientam / E eu fico um barato”!
E é com esse carinho, dessa forma afetuosa, que o escritor encerra o poema, porque é nesse ambiente de cuidado, em que o carinho e a firmeza devem se mesclar, que a educação promove o pleno desenvolvimento da criança. O trato entre pais e filhos é este: os pais orientam, exercendo a autoridade que lhes cabe, e os filhos agradecem, honrando todo o cuidado recebido. E vale lembrar: o compromisso de honrar pai e mãe deve se estender em todas as fases da nossa vida. Quando crianças, honrar significa respeitar e obedecer; na fase adulta, significa ouvir e respeitar os conselhos dos pais; e, quando os pais estão idosos, honrá-los significa cuidar e ajudá-los. Portanto, o compromisso dos pais é preservar esse ciclo virtuoso que mantém a nossa condição de transmitir a humanidade para os que estão chegando.

 

 
Nádia de Azevedo Porto
Consultoria e Assessoria Pedagógica
Desenvolvimento de práticas que oportunizam melhores resultados pedagógicos, baseadas em evidências científicas.
npdirecaopedagogica@gmail.com